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Fora do lugar

Todo dia 18 é dia de um texto novo meu na Revista Samizdat. Publico ele aqui também, para quem quiser ler por este blog:

As palavras insistem em sair, mas há tempos não viram dinheiro.

Viraram, algum dia?

Elas pedem continuam pedindo vazão e eu me atrapalho porque não tenho nem como dar-lhes o que solicitam.

Tenho que continuar tenho que continuar tenho que lutar e prosseguir só não sei com o quê.

Não sei mas ainda assim tenho que continuar com seja lá o que for que possa me manter viva e de pé enquanto as águas vão subindo e a inundação já passou do meio das costas.

Eu que gosto tanto das águas agora queria a terra e não o ar. A terra e seu cheiro a terra e sua cor avermelhada a terra e sua dureza sua sabedoria sua firmeza seu carinho.

A água só está me levando para mais fundo e não sei mais se consigo emergir ou se ficarei para sempre em seus territórios e um dia serei resgatada os olhos arregalados os cabelos arrepiados brancos perdido o sentido de tudo o mundo desgastado e distante.

Talvez seja isso se a terra não vier me buscar antes. Mas não para me levar embora. Tento me aproximar dela abaixar-me e tocá-la mas ela refuga. Ainda. Terei que conseguir subjugá-la para que ela possa então agir e me fazer terra elemento levantar e olhar para o ar de frente sem o queixo caído sem as lágrimas coladas à pele sem o desespero que já nem mais cala fundo. Ele transborda.

O chão não está aqui. Ou está mas apenas provisoriamente debaixo da cama que assenta meu corpo de bruços enquanto escrevo sob o sol. Mas não sei por mais quanto tempo. O próximo mês. Terei como arcar?

O DIU está fora do lugar, é preciso arrumá-lo. Muitas coisas estão fora do lugar, é preciso arrumá-las. Tenho forças, ainda? Estamos todos aqui presos numa coisa que fazemos e não serve mais. O que nos restará? Será que um dia servirei para fazer sorvetes que aplaquem o calor?

O pouco sempre me foi suficiente e achei que o importante era isso. O pouco. Fazer o que se quer o que se sabe o que se gosta de fazer. Nunca achei que esse pouco fosse minguar até sumir na insuficiência.

Posso, sem armas, revoltar-me? Tenho forças para isso? Tenho tempo, ou preciso correr para tentar ganhar o troco para continuar respirando o ar que ainda resta e tentar conseguir o ar de amanhã?

O gato quer brincar, é preciso distraí-lo. A criança quer saber da Via Láctea e da vida que um dia parece ter havido em Marte. Podemos, sem foguetes, nos tornar marcianos?

Os quarenta chegam logo nem posso mais dizer que se avizinham senão que correm a cavalo. E eu, conseguirei me segurar em pé?

Para onde nossa incapacidade nos deixará fugir?

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A barca Marina

 

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Geração armada: literatura e resistência em Angola e no brasil
É o título do livro originado da dissertação de mestrado que defendi na USP, no programa de Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa. Trabalhei com o romance A geração da utopia, do escritor angolanod Pepetela, e com o testemunho Viagem à luta armada, de Carlos Eugênio Paz, ex-militante da ALN.

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